Páscoa Por Telefone
Maria
Lembrando MAMÃE - no seu mês de aniversário, dia 12, pelo DIA DAS MÃES e pela Páscoa.
Foi noutro tempo, vocês podem ver. Tempo de mãe, tempo do BEM...Tudo mudou, mas a essência da Páscoa continua a mesma...
O sol repetia os vitrais das janelas
em toda a Igreja. O abril caprichou nos azuis que jogou no céu e na manhã
daquele Domingo de Páscoa.
Meu coração repetia pra mim que não
adianta carregar idade de vó numa bela manhã de Páscoa. Verdade, acho que o
Domingo de Páscoa é o 1º Natal do ano.
Foi assim, levinha, que cheguei à igreja
naquela manhã azul. Pelo braço do BEM.
O ritual da missa, as velas da Páscoa,
a voz bonita do Padre Estêvão, as suas vestes pascais, claras e alegres, o sol
assistindo à missa pelos vitrais coloridos, tudo isso me comoveu. Foi com voz
antiga e alegre que cantei o Pai-Nosso e o Creio em Deus Pai. No entusiasmo elevei
demais a voz e um senhor do banco da frente me olhou de cara fechada e olhar
espantado. Abaixei o tom, sorri pra ele – pedindo desculpas de minha alegria –
e, de novo “quandefé”, como dizia a minha madrinha Maria, quandefé, eu estava cantando alto. De novo, o homem se virou no
banco. Finji que não vi e cantei alto, como eu queria.
Em casa, não resisti. Eu tinha que
contar aquela beleza pra alguém. Senão, eu estourava. Vim matracando no carro,
certa de que o BEM me ouviria. O BEM – por certo escapou do show – tinha hora certa na reunião da
Conferência dos Vicentinos.
- Alô! Mamãe!!!
- Que bondade, minha filha! É você!
- Ah! Mamãe, a Senhora precisava ver a
beleza da “missa das nove”!
- Não fala, não! Morro de inveja!
Aí, contei do sol, falei do céu. Mamãe
quis saber se ele estava azulinho, como ela via lá de sua janela do 8º andar.
- Ah, mamãe, ele está até estalando de
azul!...
(Mamãe ria, feliz)
- A igreja estava cheia?
- Nossa! Tinha gente em pé pra todo
lado.
- Que beleza! Vontade de estar aí...
- A senhora precisava ver os cânticos!
- Ah... que beleza! Capaz que eu não
conheço mais nenhum deles...
- Conhece, mamãe, conhece, sim! Então,
a senhora não se lembra do Credo cantado?
- Aquele lá de Estrela?
- É, mamãe, aquele mesmo.
- Ah, graças a Deus, não arranjaram
outro Credo.
Mais uma vez, não resisti. Cantei de
cá:
- Creio em Deus Pai-ai ...
- Todo poderoso (a voz de mamãe ainda
é bonita, pensei).
- Criado-or do Céu e da terra.
Não sei se chegamos ao fim. A gente
conversava, ria, se lembrava de padres antigos, misturava tudo.
- Ah, Branca, eu tenho saudade é
daqueles cânticos lá de Estrela.
- Nossa, mamãe, nem me fala!
Juntas, cantamos Ave-Marias, pedaços
do Ofício de Nossa Senhora, ladainhas e Tantus
Ergos. Em latim, como cantávamos lá.
Minha cozinha cheirava a incenso e eu
podia ouvir o barulhinho do turíbulo. E São Sebastião, o Padroeiro de Estrela,
olhava pra mim, com pena de minha saudade. Às vezes, era Nossa Senhora das
Dores que tinha pena de mim, sabendo que nem Ela tinha como socorrer-me,
livrar-me daquelas saudades tão antigas... Nem a mim, nem à minha mãe.
- Branca, Nossa Senhora das Dores
ainda é aquela do meu tempo?
- É, mamãe... É a mesma, a coisa mais
linda!
Mamãe suspirava.
- Ai, que saudade de Dores do Indaiá!
- Ah, não, mamãe. Hoje é o Domingo de
Páscoa. Hoje, não! Hoje não é dia de choro!...
- Saudade não sabe que dia que é...
- Pois conta pra ela, uai: “Saudade,
hoje é dia de Páscoa!”
Caímos na risada! A alegria voltou.
O mesmo sol que pintava o arco-íris em
minha casa, certamente cobria de cores a sala de minha mãe.
E isso não é Páscoa? Um mesmo sol pra
todo mundo?
Desliguei o telefone. Meu coração
cantava. Descobri que o céu, o sol, a lua e estrelas são como o meu Deus. Um só
para todos. Um ponto que unifica, que mata as saudades, que nos aproxima.
Pois não é que, naquela manhã de
Páscoa, eu estive junto à minha mãe? E, não é que, sem sair de sua cadeira de rodas
ela visitou sua terra? Ela viu a igreja, ela ouviu seus cânticos, ela rezou nos
bancos singelos...
Foi o Domingo de Páscoa mais lindo que
tive. Claro, se o céu azul daqui é o mesmo que a minha mãe vê de sua janela...
Céu – Deus Único, vivo. Ponto certo de união. Para onde todo mundo pode olhar
ao mesmo tempo. Ponto de encontro da saudade... De saudade e cores. De poesia e
ternuras. De Deus e terra natal...
Ah, eu juro que isso é Páscoa!
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