terça-feira, 6 de maio de 2014


Páscoa Por Telefone
 
Maria
 
Lembrando MAMÃE - no seu mês de aniversário, dia 12, pelo DIA DAS MÃES e pela Páscoa.
Foi noutro tempo, vocês podem ver. Tempo de mãe, tempo do BEM...Tudo mudou, mas a essência da Páscoa continua a mesma...

 

O sol repetia os vitrais das janelas em toda a Igreja. O abril caprichou nos azuis que jogou no céu e na manhã daquele Domingo de Páscoa.

Meu coração repetia pra mim que não adianta carregar idade de vó numa bela manhã de Páscoa. Verdade, acho que o Domingo de Páscoa é o 1º Natal do ano.

Foi assim, levinha, que cheguei à igreja naquela manhã azul. Pelo braço do BEM.

O ritual da missa, as velas da Páscoa, a voz bonita do Padre Estêvão, as suas vestes pascais, claras e alegres, o sol assistindo à missa pelos vitrais coloridos, tudo isso me comoveu. Foi com voz antiga e alegre que cantei o Pai-Nosso e o Creio em Deus Pai. No entusiasmo elevei demais a voz e um senhor do banco da frente me olhou de cara fechada e olhar espantado. Abaixei o tom, sorri pra ele – pedindo desculpas de minha alegria – e, de novo “quandefé”, como dizia a minha madrinha Maria, quandefé, eu estava cantando alto. De novo, o homem se virou no banco. Finji que não vi e cantei alto, como eu queria.

Em casa, não resisti. Eu tinha que contar aquela beleza pra alguém. Senão, eu estourava. Vim matracando no carro, certa de que o BEM me ouviria. O BEM – por certo escapou do show – tinha hora certa na reunião da Conferência dos Vicentinos.

- Alô! Mamãe!!!

- Que bondade, minha filha! É você!

- Ah! Mamãe, a Senhora precisava ver a beleza da “missa das nove”!

- Não fala, não! Morro de inveja!

Aí, contei do sol, falei do céu. Mamãe quis saber se ele estava azulinho, como ela via lá de sua janela do 8º andar.

- Ah, mamãe, ele está até estalando de azul!...

(Mamãe ria, feliz)

- A igreja estava cheia?

- Nossa! Tinha gente em pé pra todo lado.

- Que beleza! Vontade de estar aí...

- A senhora precisava ver os cânticos!

- Ah... que beleza! Capaz que eu não conheço mais nenhum deles...

- Conhece, mamãe, conhece, sim! Então, a senhora não se lembra do Credo cantado?

- Aquele lá de Estrela?

- É, mamãe, aquele mesmo.

- Ah, graças a Deus, não arranjaram outro Credo.

Mais uma vez, não resisti. Cantei de cá:

- Creio em Deus Pai-ai...

- Todo poderoso (a voz de mamãe ainda é bonita, pensei).

- Criado-or do Céu e da terra.

Não sei se chegamos ao fim. A gente conversava, ria, se lembrava de padres antigos, misturava tudo.

- Ah, Branca, eu tenho saudade é daqueles cânticos lá de Estrela.

- Nossa, mamãe, nem me fala!

Juntas, cantamos Ave-Marias, pedaços do Ofício de Nossa Senhora, ladainhas e Tantus Ergos. Em latim, como cantávamos lá.

Minha cozinha cheirava a incenso e eu podia ouvir o barulhinho do turíbulo. E São Sebastião, o Padroeiro de Estrela, olhava pra mim, com pena de minha saudade. Às vezes, era Nossa Senhora das Dores que tinha pena de mim, sabendo que nem Ela tinha como socorrer-me, livrar-me daquelas saudades tão antigas... Nem a mim, nem à minha mãe.

- Branca, Nossa Senhora das Dores ainda é aquela do meu tempo?

- É, mamãe... É a mesma, a coisa mais linda!

Mamãe suspirava.

- Ai, que saudade de Dores do Indaiá!

- Ah, não, mamãe. Hoje é o Domingo de Páscoa. Hoje, não! Hoje não é dia  de choro!...

- Saudade não sabe que dia que é...

- Pois conta pra ela, uai: “Saudade, hoje é dia de Páscoa!”

Caímos na risada! A alegria voltou.

O mesmo sol que pintava o arco-íris em minha casa, certamente cobria de cores a sala de minha mãe.

E isso não é Páscoa? Um mesmo sol pra todo mundo?

Desliguei o telefone. Meu coração cantava. Descobri que o céu, o sol, a lua e estrelas são como o meu Deus. Um só para todos. Um ponto que unifica, que mata as saudades, que nos aproxima.

Pois não é que, naquela manhã de Páscoa, eu estive junto à minha mãe? E, não é que, sem sair de sua cadeira de rodas ela visitou sua terra? Ela viu a igreja, ela ouviu seus cânticos, ela rezou nos bancos singelos...

Foi o Domingo de Páscoa mais lindo que tive. Claro, se o céu azul daqui é o mesmo que a minha mãe vê de sua janela... Céu – Deus Único, vivo. Ponto certo de união. Para onde todo mundo pode olhar ao mesmo tempo. Ponto de encontro da saudade... De saudade e cores. De poesia e ternuras. De Deus e terra natal...

Ah, eu juro que isso é Páscoa!

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