domingo, 26 de janeiro de 2014


RÁDIO ATIVA


MARIA


 

             Estou de férias. Como sempre, é a mesma coisa: quando tenho tempo, não tenho tempo para nada...

            Ajuntei uma sorte de roupas _ ainda se fala assim? _ para consertar: os netos crescem e as barras das roupas diminuem.

            Separei linhas e estou tecendo uma blusa colorida, de quadrinhos antigos, aprendidos com minha avó Cristina.

            Comecei um bolero de tricô, mais fácil para fazer, vendo televisão – sou noveleira-mestra!

            A tinta do cabelo me espia e eu nem ligo pra ela... Tenho a maior preguiça de pintar cabelo – para mim, um dia perdido. E, quando invento _ hoje estou mineiramente inspirada _ chega visita e eu não posso sair lá fora.. Parece sonho _ é, hoje não tem jeito – estou indo no fundo do baú ...

            Eu, parecendo uma bruxa e a visita toda fresca, de sapato de salto, esperando a dona da casa, às vezes, a escritora... Fica aquele constrangimento, aquela desconfiança no ar, ninguém acreditando na sessão de beleza... Sabe como é: cá pros nossos lados, não há o costume de se avisar  sobre a visita e porta trancada não combina muito com a gente.

            _ Ir ao  Salão? Piorou! Tenho mais preguiça ainda: corto volta de Salão.... por isso mesmo, ando nesta beleza toda!

            Mas eis que tive tempo de ouvir a Rádio Ativa de Dores do Indaiá. Entre músicas e comerciais, o Carlinhos da Rádio – ou seria o Fernando Zica? – lançou ao ar um simpático apelo: D. Fulana está inconsolável e pede a ajuda dos prezados ouvintes: Desapareceu de sua casa um cravo de estimação que atende pelo nome de Louro. Trata-se de relíquia de família. O Louro era de um sobrinho ... O moço  faleceu e ela   adotou o cravo..

            Tive pena da dona do Louro, pena mesmo

            Eu também tinha uma crava, lindinha, a Tataca. Já contei aqui que ela roeu o fio de telefone, uma ligação antiga, lá no barracão e que ficamos sem poder conversar por dias e dias, lembra-se?

            Pois, olha o quê aconteceu com a Tataca... Troquei a gaiola dela de lugar, na maior inocência. A danadinha descobriu outro fio....

            Na manhã seguinte, a Vani gritou:

            _ D. Branca, nossa! A Tataca morreu!

            Não acreditei! A Tataca estava esturricadinha, mortinha, agarradinha aos arames da gaiola. Ela descobriu outro fio... da linha elétrica - que eu nem havia atinado... Chorar foi pouco...

            O Dirceu, meu genro,quis acabar logo com aquela lenga-lenga: fez uma covinha rasa e enterrou a cravinha Tataca.

            Daí, veio uma ventania, varrendo o quintal. Cá de cima da escada, fiquei olhando, olhando sem ver...

            Então, uma folhinha me chamou a atenção- Ah, deve ser uma mudinha que o Eduardo plantou... Vou protegê-la do vento... (O meu filho  gosta de semear plantas antigas e diferentes e eu  o ajudo).

            Fui ver. Não era folha. Era o rabinho da Tataca que ficou de fora....

            Chorei de novo, chorei. E não havia Rádio Ativa que me acudisse...

                            Dores do Indaiá, 12 de abril de 2002.

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário