PEQUENOS
SUSTOS/1
Maria
Bobagem
pura: eu revirava na mão a peça que
caíra do dente - e que eu trazia embrulhadinha em um chumaço de algodão...
Já
disse: bobagem pura... Mas enquanto eu esperava minha vez, era a única
distração, além das revistas que eu já conhecia...
_ Traga
a peça, D. Branca – talvez facilitará
o trabalho...
Por isso, eu estava ali, alheia a tudo – dentista sempre me deixa fora do
ar... Bobagem pura: eu virava e revirava
a minúscula causa de minha visita à querida
Doutora Eleusa Vaz, a simpática dentista que cuida do meu sorriso há muitos
anos.
Como sou muito avoada, enquanto
esperava minha vez, nem sei para onde
voei: estava longe... Fiquei fada...
_ Bom-dia! Que prazer encontrar tão ilustre escritora !
Pensei que era a Eleusa
...Levantei-me rápido e...
Acordei... Voltei a si, como dizia minha boa madrinha de
crisma, lá em Estrela.
Quandefé
– outra palavra estrelada- estava diante de um senhor muito elegante- advogado – camisa social, de mangas
compridas (eu tenho a maior cerimônia com camisas de mangas compridas...) calça de vincos muito bem feitos, cabelos
recentemente penteados, e um sorrio iluminado para a ilustre escritora!!!!!
Desorientei-me: (camisas de mangas
compridas sempre me inibem...) e eu não sabia se me assentava de novo, se apertava a mão que o
recém-chegado me estendia, se
fechava a bolsa, se escondia a
bendita peça do dente, se sorria, se
agradecia, se blá-blá-blá-blá...
Claro, fiz tudo de uma só vez, me
compliquei toda....
Foi tudo junto: a porta se abre e –
desta vez - a Doutora Eleusa me chama... O senhor elegante pede uma palavrinha
com ela, estende a mão, guarda a mão, mil braços e mãos se cruzam, ninguém sabe
quem é quem...Ele se despede, fica um
leve cheiro de creme de barba no ar e...
Entro e me ajeito
na terrível cadeira/maca da dentista.
_ Trouxe a peça, D. Branca?
_ Trou-ou-ou-xe, sim, Eleusa! (Tomara que dê certo, pensei eu, por todos os
motivos )
Gente, revirei bolsa, despejei tudo na
mesa do consultório, fomos à sala de espera, reviramos as almofadas, arrastamos sofás, sacudi as
revistas, olhamos debaixo das cadeiras, até
o lixinho nós reviramos... A situação se tornou motivo de brincadeira para nós
três, transformadas em alegres meninas... Kelly, a auxiliar, ria que ria da
confusão; Eleusa queria porque queria
encontrar a tão preciosa peça e eu, então, nem se fala!
Nunca achamos o dentão!
Resignadamente, concluí:
- Vai ver que a peça entrou pela manga da camisa do Doutor e ele nem deu pela
coisa...Só pode ser isso!
Até hoje, quando passo pelo ilustre
advogado, levo um sustinho e fico pensando na minha tão sonhada coroa- de-
dente...
PEQUENOS
SUSTOS/ 2
Já a Eleusa também teve seu momento
de...
Caminhada matinal, sem poder parar,
tempo contado, clientes marcados...
Ao atravessar uma rua, chega não chega,
eis o inesperado:
_Doutora, faz favor!
Ela não acreditou: um senhor, também
caminheiro contumaz, abriu uma boca deste ta -a-ma-a-a-nho!– e ali mesmo, entre
os passantes, fez uma consulta inesperada, com trejeitos doloridos, caretas e
coisas mais!
Até hoje , o causo do advogado de mangas compridas
e esse da Dra. Eleusa são relembrados por nós, sempre que vou ao consultório
...e eu até me esqueço da anestesia, do motorzinho, do motorzão e afins...
A Kelly, secretária da Dra. Eleusa, também
contou o seu causo: no Sacolão, escolhia verduras e frutas, distraída, quando
alguém lhe cotucou:
- Eu estou precisando ir lá na Doutora
Eleusa, mas... estou sem tempo.
Você já
entende muito de tratamento dentário, veja aqui!
Kelly, de repente, estava diante de uma
possível cliente
de sua Chefe , entre melancias, laranjas e abacaxis... Não teve como se
safar...
A
mulher abriu a bocona, mostrava dentes e
línguas, apontava com a caneta e pedia o orçamento desse, daquele, do outro
dentão lá do fundo...
Kelly
caiu das nuvens! Eu anotei mais esse causo de interior na minha agendinha e... tomara que as duas
nunca saibam que eu contei tamanhos acidentes pra
todo mundo...Senão, adeus anestesias a toque de risadas!
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SUSTOS/3
Cada
um no seu ofício...
Eu
ia satisfeitinha pro Pilates, pensando/voando, embaixo de um céu tão azul que
fazia pena andar depressa; ia devagarinho, sorvendo goles de azul...
Na
esquina, dei de testa com um jovem
esportista, sorriso aberto, tênis imensos, boné jovial, pele tostada.
Ao
dar comigo, deu uma freada com seus pneus nos pés e fuzilou:
_
D. Branca, bom ver a senhora!_Como se escreve aedes aegypti?
_
O quê –ê-ê-ê????!!!!!
Nunca
levei susto tão grande!
Juro,
não sabia onde estava, para onde ia, me
esqueci até do meu nome...
E
o jovem tentando me ajudar:
É
... É o nome do mosquito da Dengue..
Quase
desmaiei - buscava lá no fundo da minha
pobre memória as benditas letras do
maldito mosquitinho...
Vacilei
nos Ys e Hs da vida, espremi os miolos... Ele
esperava, risonho e me animava: isso pra
senhora não é nada, todo mundo aqui em
Dores conhece esse mosquitinho... Escrever o nome dele é que são elas!!! (Eu pensava:
ter dengue é que são elas...Eu é que sei contar!)
Anotei
o nome do mosquito/dengoso no talão de cheques que o inusitado aluno me
estendia...
Atravessei
a rua, olhei para trás. De longe, ele tirou o boné vistoso e com ele me deu um
tchau alegre e simpático.
Lá
de cima, o sol mandava um sorriso de ouro para a terra embrulhada em uma bela
manhã azul...
Dores do Indaiá, 20
de dezembro de 2011.
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