sábado, 25 de janeiro de 2014


BELEZA

Maria.

 

Hoje nem é domingo, nem é 1º de abril...

Mas...O BELEZA passou, do mesmo jeito, espalhando seu grito alegre pela cidade. Não resisti...

Abri a janela, comprei coouve, alface e quiabo... Tudo igual...

A crônica é para vocês morrerem de inveja de mim, que fiquei aqui, catando retalhos de ternuras...

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Uma voz conhecida acorda a rua:

- Beleza! Be-le-za-a-a! Couve, alface, quiabo, bele-e-e-za-a-a!

O homem para, descansa o corpo na árvore do passeio e espera calmamente. As casas despejam um bando de mulheres-maritacas na manhã azul.

Conversam, trocam receitas do domingo, contam casos das visitas, as roupas que usam e seus modismos.

O homem da BELEZA vigia seu carrinho só com um olho. O outro cisma, entra na conversa, concorda e discorda das notícias miúdas que ouve.

Só na hora do acerto, o outro olho se abre. Preguiçosamente o BELEZA faz as contas, acerta o troco, dá descontos ínfimos e as maritacas sentem-se recompensadas.

- Vou fazer quiabo com angu e carne moída...

Uma delas, mais jovem, quer saber como se faz quiabo sem baba.

Há um ligeiro alvoroço, todas falam ao mesmo tempo. A pobre moça fica aturdida, pega fiapos de mil dicas e olha desolada para os quiabos que esperam em suas mãos rosadas.

- Tem de fritar!

- Tem de tirar as sementes!

- Duas gotas de limão!

- Ponho é vinagre!

- Uma maritaca mais experiente fala – em tom professoral – e o bando se cala:

- Pois eu vou pingando água sem tampar a panela...

As casas engolem as maritacas e cada uma vai pensativa sobre os quiabos do almoço.

Só então o BELEZA dá por mim na janela.

Entusiasmado com a única testemunha do pequeno e animado show das maritacas, olha para mim, faz uma ligeira reverência, toca a aba do chapéu de palha, enche os pulmões e solta seu alegre pregão:

- BELE-E-E-ZA-A-A-A-A!

Fico benta por aquele momento de paz e, na outra esquina, vejo outro bando de maritacas cercando o carrinho de verduras.

Só aí sondo o céu.

Lindamente azul! Céu lavado de fresco, sem uma mancha.

Se eu fosse menina, veria um avião riscando esse azul, soltando rabiscos de pura magia no céu de Estrela, E eu falaria:

- É um avião da Panair!

Sorrio para a doce lembrança e a janela aberta joga um pouco de céu dentro da minha sala e do meu coração.

Certamente o abril vai enfeitar a terra com as manhãs mais bonitas do ano.

E, certamente, sempre haverá alguém gritando “BELEZA” nas ruas.

Certamente sempre haverá um coração debruçado na janela para recolher aquele instante poético.

 

(Para o meu caçula, Paulo Emílio, que, há 40 anos, quase nasceu em uma manhã assim,de 1º de abril. Mas preferiu adiantar o momento de ternura, nascendo em 31 de março.)

 

 

Dores do Indaiá, 1º de abril de 2008

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