segunda-feira, 31 de março de 2014


Prezados leitores do meu BLOG,

 

A Entrevista com a Educadora, MARIA HELENA FIÚZA GUIMARÃES

- D. HELENINHA – enriqueceu nossa pesquisa sobre a Escola Normal.

        Com clareza, objetividade nas respostas, com sua elegância natural- em todos os sentidos, D. Heleninha construiu uma história respeitada por todos. Seu nome é referência na Educação Dorense, fazendo justiça à sua linhagem , vinda de famílias tradicionais de Dores do Indaiá, berço de grandes intelectuais, escritores, poetas,e políticos, importantes na trajetória cultural do Município.

Filha do Dr. Antônio Caetano da Silva Guimarães Júnior (Cirurgião Dentista), o poeta, Tonico Caetano, e de D. Maria Rita Fiúza de Faria, D. Heleninha merece nossos melhores agradecimentos pela grande contribuição histórica que passo a vocês, continuando nossas homenagens à Escola Estadual “Francisco Campos”, iniciadas em comemoração a seu aniversário, ocorrido em 22 de março.

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Dores do Indaiá, 31 de março de 2014.

Maria das Dores Caetano Guimarães – Maria.

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ENTREVISTA :(Respostas)

  Belo Horizonte, 11-01-2011

 Prezada Branca

 Demorou um pouco em enviar-lhe as respostas aos questionários que você me enviou e, ao mesmo tempo, cumprimentá-la e à sua equipe, pela oportuna iniciativa de desenvolver um projeto sobre a nossa querida Escola.

 Fiz um esforço de memória para relembrar os episódios mágicos que marcaram minha vida de aluna, professora e orientadora das Classes Anexas à Escola Normal.

 Quantas saudades e quantas!

* Passo então a relatar, conforme sua sugestão, resumindo, é claro, de maneira sucinta, o que ficou na minha lembrança.

 Conforme disse acima, não fui Diretora das Classes Anexas. Era apenas orientadora e coordenadora, cargo inerente às cadeiras de Metodologia e Prática de Ensino.

 Como estava sempre em contato com as crianças e orientando as professoras, fui considerada, muitas vezes, como Diretora.

* Casos mais graves de disciplina ou reivindicação para melhorar ou andamento das atividades pedagógicas, era função do Diretor da Escola, servindo eu de intermediária.

 *Foram vários os diretores com os quais convivi, escolhidos através de uma experiência comprovada ou indicados pela Secretaria de Educação:

 - Fui aluna de alguns deles que, além de Diretores, ministravam alulas: Dr. Edgard Pinto Fiúza, Dr. Eurípedes, Dr. Ovídio, João Batista;

 - Fui colega -como professora – de  outros Professores que dirigiram a Escola: Ester Alves, Dr. José Bernardes, Anselmo Barreto Artur Diniz, Prof. Leonardo, Pe. Miranda e João Neves.

* Todos eles esforçados na manutenção do legado cultural que a Escola representava na época, não só para o nosso município, como nos municípios vizinhos. A projeção de suas bases culturais, o corpo docente, o ensino propriamente dito, atravessou fronteiras e alunas de Abaeté, Bom Despacho, São Gotardo, Estrela, Patos de Minas, Morada Nova, vinham buscar ensinamentos, convivência sadia no nosso Centro Educacional. Frequentavam os cursos oferecidos na época: Admissão, Normal e Aplicação.

* Com o diploma de Normalista, voltavam às suas cidades para exercer a profissão para a qual se preparam, enfrentando, sobretudo, a questão salarial, sempre questionável. A vida no interior naquela época era simples e os vencimentos satisfaziam às exigências da sobrevivência. Mais sério quando havia atraso no pagamento, como aconteceu várias vezes. No governo de Magalhães Pinto, se não me falha a memória, é que o pagamento se normalizou.

* A missão do educador , como sabemos, é árdua e o salário nunca esteve à altura de seu trabalho, de sua dedicação, da atualização de seus conhecimentos, o esforço do dia a dia. Apesar de tudo, o magistério era considerado um sacerdócio e as professoras em geral não se envolviam nas greves que aconteciam. Os diretores sempre cautelosos, orientavam os professores na posição a tomar. O povo de Dores apoiava essas soluções, pois a Escola era o centro da sociedade dorense: os professores dedicados, alunas estudiosas, faziam dela um legado sem igual, um patrimônio valioso.

* Os pais participavam, em parte, da vida escolar, comparecendo às reuniões específicas, comemorações sociais e cívicas, desfiles etc. 

* A Escola teve o privilégio de ter uma equipe de professoras, especialistas em educação, atualizadas nos Cursos de Aperfeiçoamento (hoje Administração Escolar):

 - Iracema Dufles Teixeira (Rio de Janeiro)

 - Ester Alves (Ouro Preto)

 - Palmira Lobo (Pindamonhangaba – SP)

 - Aspásia Vieira Ayer (Alfenas) - com especialização em Educação Física, na Bélgica.

 Essas ilustres professoras, além das disciplinas que lecionavam, se congregavam para uma educação integral.

 Assim ministravam aulas de Socialização, com sábias orientações sobre a conduta pessoal, etiquetas, etc. Organizavam sessões recreativas e culturais no Salão Nobre da Escola (onde se destacavam: pinturas com medalhões, cortinas adamascadas, cadeiras estofadas), onde eram apresentadas palestras, poesias, cantos e outros.

* No Galpão, demonstração de ginástica, danças folclóricas, jogos recreativos e treinamento de vôlei e basquete.

 *Não havia jornais editados – era comum o jornal-mural, com notícias importantes, aniversariantes do mês, resumo de estudos realizados, composições premiadas, poesias, acrósticos, etc.

* Os funcionários: Maria Rita Melgaço de Souza, Cornélia Véo, Sr. O´Conell, Otília e outros, eram amigos e auxiliares na disciplina e na conservação do prédio.

* Havia também salas especializadas para estudo de cada disciplina: museu com animais embalsamados, esqueleto humano e esfolado, cérebro humano (também embalsamado), cobras embalsamadas, gravuras ilustrativas da fauna e flora brasileira e muito material a mais para estudo da anatomia humana. Este material veio diretamente da Alemanha – um dos primeiros diretores, Dr. Henrique Schmitz, alemão, conseguiu de Francisco Campos (então Secretário da Educação), através de Antônio Carlos (Governador de Minas), autorização para a aquisição e transporte do referido material.

 *As aulas de Ciências e Biologia eram enriquecidas com a visualização desse material e as crianças das Classes Anexas se encantavam com a realidade encontrada.

 Destaque para os laboratórios de Ciências e Biologia. A Sala de Ciências era composta de material específico de laboratório (cadinho, lâminas, mercúrio, painel de eletricidade.

 As alunas mais antigas, uma vez por semana, faziam a limpeza desse material, sob a orientação do professor Dr. Henrique Schmitz.

 A Sala de Psicologia, com aparelhamento destinado à avaliação dos alunos. 

* A Biblioteca completava o estudo realizado nas salas de aula; possuía um acervo singular – obras literárias e didáticas, algumas em língua estrangeira de educadores ilustres: Dewey, Decroly, Claparide e outros. A disposição dos armários e mesas favoreciam a pesquisa e aulas de leitura (nas Classes Primárias eram desenvolvidos os Clubes de Leitura e cada classe tinha seu “Cantinho do Livro”.

 Na parte térrea – Sala de Geografia: coleção de mapas de todos os continentes, com uma disposição específica: colocados nas paredes podiam ser abaixados, conforme a área em estudo; painéis representando aspectos reais da natureza, montanhas, rios, vulcões etc.

 Sala de Música: pianos, para auxiliar os solfejos e aprendizagem de hinos recreativos e patrióticos.

 *O pátio arborizado, obra do professor Tonico Macedo, que nele plantou árvores floridas principalmente na primavera, servia de recreio e comemorações cívicas: “Dia da Árvores” e sociais: aniversários.

 *As Classes Anexas funcionavam em prédio separado, ao lado da Escola, de 1ª. À 4ª. Série; eram destinadas também ao estágio das alunas que se preparavam para o magistério. Além da observação das aulas, as alunas mestras auxiliavam as professoras no preparo das atividades e na confecção de material pedagógico; organizavam teatrinhos de sombra, fantoches, histórias, sobretudo na “Semana da Criança”.

* Mais tarde, com o aumento de alunas vindas de municípios vizinhos e sem lugar certo para se hospedarem, foi cedido o prédio para o Internato, dirigido pelas Irmãs Vicentinas (Ir. Teixeira Mota, Luiza Maria José Linhares, Ir. Vicência e outras).

* As classes primárias passaram a funcionar no prédio da Escola Normal.

* Depois de um certo tempo, uma noite, as alunas internas já dormiam, quando foram surpreendias por um curto-circuito, que destruiu todo o prédio. Elas saíram às pressas, apavoradas, de camisolas ou pijamas.

 O fogo se alastrou, as Irmãs correram com as alunas para o Grupo Escolar Benjamin Guimarães.

 Pe. Luiz Bueno, Capelão do Internato, ao chegar à praça, parou perplexo, sem compreender o que havia acontecido. A notícia se espalhou; a população se comoveu e muitas famílias deram abrigo às internas, até que se estabelecesse um local determinado para elas. Só mais tarde o prédio foi reformado, nos moldes da primeira construção.

* Não frequentei o Curso de Adaptação, que dava entrada ao Normal e como opção o de Aplicação. Fiz o correspondente no Ginásio Dorense e depois o Normal, já que o diploma de Normalista dava um status inigualável ao de hoje. As moças do interior não tinham outra escolha: ser professora o dona de casa. Depois de 3 anos a aluna colava-se em 1º. Grau.

* Minha turma era composta de 24 alunas, de Dores, Bom Despacho, Abaeté, Luz, São Gotardo e Patos de Minas. Foram nossos professores:

 - Iracema Dufles Teixeira – Metodologia

 - Palmira Lobo – Educação Física

 - Dr Ovídio José dos Santos – Ciências

 - João Neves – Matemática

 - Música e Canto Coral – Célia de Oliveira

 - Hilda Bernardes – Desenho e Trabalhos Manuais

 - Waldemar de Almeida Barbosa – Geografia

 - Dr. Eurípedes Campos Vaz e Melo – Português.

 *As aulas eram quase sempre expositivas e as alunas faziam suas anotações. A disciplina era muito boa. As alunas, em geral, respeitavam os professores, tornando-se, muitas vezes, suas amigas.

 Faziam-se filas para a entrada nas salas de aula e, uma vez por semana, cantava-se o Hino Nacional, à frente do prédio, com o hasteamento da bandeira.

* Havia alunas de várias classes sociais e, para atender ao nível social mais baixo, bolsa de estudo e cantina escolar; respeitava-se também a religião de cada aluna.

* O uniforme, estilo marinheiro: saia azul marinho, pregueada, blusa branca, gola marinheiro (do tecido da saia), meias pretas, nem sempre condizia com o clima da cidade.

 A gravata indicava a série: I, II e III - Normal.

* Uma vez por mês, um professor fazia uma palestra, à noite, no Salão Nobre, de acordo com a disciplina que lecionava.

 Compareciam alunas, professoras e às vezes, alguns pais.

 *Os recreios eram uma oportunidade de convivência entre colegas – no galpão ou à sombra das belas árvores.

* Digna de atenção era a exposição de trabalhos manuais, confeccionados pelas alunas, sob a orientação das professoras de trabalhos manuais. Era aberta ao público.

 *No fim do ano, as promoções eram feitas através de provas orais e escritas.

* A entrega dos diplomas era realizada em solenidade festiva, com paraninfo da turma e discurso da oradora, escolhida pelos colegas.

 *A observação nas Classes Anexas era realizada nas salas da professoras:

 - Selva Augusta de Souza

 - Alda Ribeiro

 - Altina Costa

 - Walkiria Melgaço Guimarães

* Das 24 alunas que colaram o 1º. Grau, apenas duas seguiram o Curso de Aplicação, Pedrolina Álvares de Azevedo e eu.

 Foram nossos professores: 

 - Ester Alves – Metodologia e Prática de Ensino

 - Sílvia Moura Soares – Psicologia Educacional

 - Dr. José Bernardes Filho – História da Educação

 - Palmira Lobo – Educação Física

 - Dr. João Chagas de Faria – Biologia

* De posse do diploma de 2º. Grau, substitui alguns professores da Escola, inclusive no Curso de Acomodação, em vista da Reforma do Ensino.

* Depois fui assistente de D. Ester Alves, então professora de Metodologia e Prática do Ensino e mais tarde, Diretora da Escola.  D. Esterera natural de Ouro Preto, onde completou o Magistério. Em Belo Horizonte, matriculou-se no Curso de Aperfeiçoamento, no Instituto de Educação.  Completado o curso, foi designada para a Escola Normal “Francisco Campos”, como professora de Metodologia e Prática de Ensino e orientadora das Classes Anexas e, comprovada sua eficiência, Diretora da Escola por duas vezes, em 1938 e de 1946 a 1951, ano  de sua morte.

 *No dia 13 de março de 1951, no 1º. Horário (tendo antes passado na Capela do Internato, onde morava), dando aula para uma das turmas do Curso Normal, foi acometida de uma súbita parada cardíaca, fulminante, vindo a falecer na própria sala de aula, na presença das alunas. Seu irmão João, farmacêutico também em Dores, foi chamado e nada pode fazer. O velório foi no Salão Nobre da Escola e exposto à visitação pública.

 *O enterro foi no dia seguinte, com a presença dos corpos docente e discente e grande parte da população de Dores.

 A Banda de Música Santa Cecília acompanhou o féretro, executando marchas fúnebres. Os irmãos de D. Ester, Antônio, dono da farmácia, que também residia em Dores; Benedito, professor da Faculdade de Engenharia; Maria do Rosário e Odila (professoras aposentadas) e Pe. Geraldo, professor da UFGM. A memória de D. Ester ficará gravada na trajetória histórica da Educação em Dores do Indaiá.

 *Com a morte de D. Ester, a cadeira de Metodologia e Prática do Ensino ficou acéfala. Laura Fiúza Guimarães, então Secretária da Escola e eu fomos a

Belo Horizonte, para conseguirmos junto ao Secretário da Educação, expor o problema.

 Fui aconselhada a prestar exame de suficiência para ocupar a referida cadeira.

 Fiquei alguns dias em Belo Horizonte e, na data marcada, compareci ao Instituto de Educação para prestar o referido exame: prova escrita e uma aula pra uma turma do referido Instituto, de um assunto previamente sorteado.

 Felizmente, fui aprovada por uma equipe de três professoras do Instituto e, voltando à Escola, tomei posse nas referidas cadeiras e orientação das Classes Anexas.

 *O meu trabalho com as alunas- mestras, além das aulas, foi: pesquisas na Biblioteca, estudo dos grandes educadores; foi desenvolvido um trabalho com alunos de classe social inferior. 

* Por ocasião da “Semana da Criança”, visitávamos escolas rurais, onde as alunas apresentavam teatrinhos de sombra, fantoches e dramatização de história infantis.

* Com colaboração  de diretoras das grupos escolares, as alunas, divididas em grupos, desenvolviam atividades de observação e participavam, quando solicitadas.

* Nas Classes Anexas desenvolviam atividades inerentes à Prática de Ensino: observação, participação e direção das atividades.

 *No 1º. caso, apenas observavam. No 2º.caso, participavam das atividades e no 3º., dentro de um assunto previamente escolhido do programa, davam aulas, sob a supervisão da professora de Prática de Ensino.

* Grandes atividades eram levadas também na “Semana da Criança: comemorações da data, fantoches, distribuição de merenda e confecção de lembrancinhas. Participavam também nos dias das mães e dos pais.

 As alunas, durante o curso, confeccionavam material pedagógico ilustrativo e visual para uma exposição no fim do ano, aberta ao público, principalmente às professoras.

 *Trabalhei com as professoras Norma Assunção, Pedrolina Álvares de Azevedo, Letícia Guimarães Machado, Therezinha de Faria Guimarães, Ailma Lopes, Maria Campos de Paiva, Dilza Rezende de Castro, Ornélia Inácio, Zaira de Lacerda Bernardes e outras, que ficaram pouco tempo.

* A Secretaria de Educação promovia anualmente o “Curso de Férias” e os professores eram convocados de acordo com as disciplinas que lecionavam.

Os professores ficavam em hotéis ou casas de família e a Secretaria arcava com todas as despesas. Era um encontro com docentes de outras cidades, com objetivos e ideais afins. As aulas eram ministradas no Instituto de Educação e tinham o patrocínio do não Programa de Assistência Brasil/Estados Unidos, além de professores brasileiros. Novas técnicas de ensino eram desenvolvidas e levadas para as respectivas escolas.

* Em 1966 fui convidada pela Secretaria da Educação a fazer um curso na DAP (Divisão de Assistência do Professor), para atualização e melhoria do ensino.

 Funcionando na Gameleira, encontrei um ambiente amigo e acolhedor.

 As experiências foram ricas e tive um ótimo contato com colegas de Minas e de outros estados. Voltei em 1967, assumindo as funções anteriores.

* Em 1968 fui convidada a fazer parte do corpo docente do MEC, na área de Estudos Sociais. Várias ex-alunas assumiram as minhas funções: Maria das Dores Caetano Guimarães (Branca), Nívea Caetano e outras que desenvolveram também um bom trabalho. 

* Digna de nota foi a projeção de ex-alunas na Capital, lecionando no Grupo de Demonstração Prof. Leon Renault, do Centro de Recursos Humanos João Pinheiro: Joanice Lino da Silva, Joana D´Arc Lino da Silva, Maria Lúcia Gomes e Conceição Moura Bonfim.

* Com o passar do tempo, o prédio da Escola Normal precisava de reformas. 

 A Secretaria de Educação, consultada, liberou uma verba para a referida reforma. Enviou uma equipe de técnicos para fazer o projeto e iniciar os trabalhos. Infelizmente, não houve uma fiscalização a contento e muito material se perdeu, afetando o acervo inigualável da Escola.

 *Hoje, relembrando minha missão de responsável, entre outras, pela formação de jovens, penso que eu contribuí para que nossa Escola formasse professoras dignas, idealistas e que ainda hoje conservam, na mente e no coração, as lições aprendidas e o doce convívio com professores e colegas. 

 Aqui fica o meu pesar: que a Escola, fundada para formar professoras, não tenha mais o Curso de Magistério!

   Maria Helena Fiúza Guimarães

 

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