SAUDADE FEITICEIRA.
Maria
“Não
existo sozinha/Meus olhos são luzes de outros olhos/Que sondaram o infinito
antes de mim...
Meu
horizonte é tecido de ontens/Minha face são tantas /Bordadas de nuvens/Tecidas
de sol”... (Fusão – Poema )
E
hoje, sou muitas.
Sou
madrugadas antigas, sou o canto das águas do Indaiá. Sou as valsas rodadas, dançadas no Clube Velho. Sou a
gravatinha fitada da Escola Normal...
Criei asas nas saias rodadas , anáguas rendadas, aladas, asas de anjo que me levaram a mundos de nuvens e cetins.
Criei asas nas saias rodadas , anáguas rendadas, aladas, asas de anjo que me levaram a mundos de nuvens e cetins.
Sou
as ruas de terra, recebi mil batismos: Rua das Baratas, Rua das Viúvas, Rua de
Baixo... Ou Rua Bela ou Rua do Meio...
Meu
coração é feito do melado de rapadura, adocicado
por mangas cheirosas e
jabuticabas de mel.
Se fecho os olhos, a saudade faz uma bruxaria
no meu coração e eu sou o telhado de casas avoengas que espiavam o arraial nascente. Pouso na sineira antiga e
canto ladainhas com os velhos sinos velhos
da Igrejinha primeira que rezou
nessa terra vermelha: a Igrejinha de São Sebastião.
Saudade feiticeira! Carrega meu coração para
o Largo do Bem-Te-Vi e me conta
histórias dos velhos tropeiros ... Entro em seus ranchos poéticos e escuto
segredos do ouro dos Goiazes... Encho embornais
de matulas na venda da Carioca e
sigo em frente, plantando arraiais, plantando palavras, plantando histórias de
além-mar...
Ah, saudade feiticeira! Ela entra em meu coração, apronta mágicas e o carrega por
horizontes azuis, desenhados pela poesia...
Por
suas mãos tenho mil faces : acordo com
rosto de de pôr- de-sol e vou dormir
nos braços da Serra Azul da Saudade. E é
tanto azul que ele se derrama no manto bento da Senhora das Dores... A Santa
Azul que mora num altar, ladeada por
anjos tocheiros. Às vezes, a saudade faz
outra bruxaria e eu fico com oito anos... Então, posso coroar a Santa Azul e
brincar com as estrelas e luas de sua coroa
de sol...
Se
fico cansada, a feiticeira voa comigo e eu cochilo com os cânticos das procissões , e as ladainhas
cantadas por vozes antigas. Cochilo com as danças do Congado e pago promessas
ao redor da Igreja do Rosário...
Gosto
de viver em companhia da minha amiga
feiticeira: ela me traz rostos antigos e falas queridas. Ela me diz versos bonitos de poetas que não conheci...A feiticeira me traz rosto de mãe, falas de pai, risos
dos filhos pequenos. Outras vezes, me
pego de saia comprida, bichas de ouro nas orelhas e camafeu numa bela correntinha. De repente, tenho
quinze anos e ouço serenatas românticas
ao luar...
Não
tenho medo da palavra PASSADO! É lá que
guardo quintais perfumados, casarões antigos,
e Natais encantados. É no passado que encontro histórias.Foi no passado
que prendi - para sempre- um moço bonito com um lacinho azul na lapela- magia das barraquinhas de maio...
_ Quem falou que saudade é tristeza? Saudade - para mim- é quase alegria – tem rosto,
tem alma, tem voz e coração. É diferente de nostalgia .
Nostalgia
é saudade com uma roupagem de névoa, deformada, mal desenhada... Nostalgia é
uma saudade que não consegue chegar ao meu coração...
Ronda, ronda, incomoda, incomoda e se vai... Saudade , não: chega,
sente-se em casa, fica morando comigo...
Sou
tecelã do tempo, aquele que vigio dia
e noite, para tentar aprisioná-lo... Se penso em deixar o tear encantado, logo
aparece uma ponta de linha para eu puxar e tecer, tecer, tecer...
Deus meu, agora a saudade feiticeira fez uma
grande mágica em meu coração: ganhei de
presente o PASSADO de minha terra, lugar encantado que fez sua morada na Terra do Infinito. Um lugar onde
tudo dormita no azul, aprisionado em fotos
com rosto de eternidade.
Dê
as mãos à saudade feiticeira: caia no colo da tradição, brinque de roda com a
nossa Cultura. Pise com passos de nuvens, para entrar no reino encantado de
nossa HISTÓRIA.
Seu
coração ficará bento, pensando que tem poderes mágicos...
Acredite
– tudo é magia da Saudade Feiticeira...
Dores
do Indaiá, 14 de agosto de 2012.
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