terça-feira, 3 de junho de 2014


LEITE DA ROÇA

 

Leite em caixinha, leite ensacado nunca me pegou! Gosto de leite da roça, gosto do barulhinho da charrete, gosto do cheiro de roça, do cavalo. Gosto de ver a latona antiga, o litro de alça em que o leiteiro mede o leite e põe mais um pouquinho “pra descontar a espuma”...

Às vezes, os netos sobem na charrete e dão uma volta grande com o leiteiro, numa alegria abençoada. E voltam contando o nome das vacas:

Mimosa, Fumaça, Sombrinha...

Fico terna, fico fada, lembrando-me das fazendas de minha infância... Com o nome delas, eu faria um poema.

“Melindro, Boqueirão, Vitória, Porteira Pesada, Campo Alegre, Barras, Olaria, Mata de Eufrásia, Monjolo, Pé da Serra, Jabuticabas, Marmeleiro, Prendas, Rio Manso, Cor’go das Almas, Cor’go de Nossa Senhora, Tapuias, Pasto Verde... Estrela. Paracambi..”

O gosto de leite do curral curou meu coração, fincou raízes e nele fez morada.

*                  *                   *

Com o tempo, “aprimorei” a entrega do leite: deixo uma vasilha na mesinha do alpendre. O leiteiro – um amigo antigo – deixa o leite e, depois, a gente pega lá.

Ali mesmo, através de bilhetes, fazemos o acerto: ele deixa a conta, num papelzinho, debaixo da vasilha. No outro dia, deixo o dinheiro. Se há troco, ele deixa lá e nunca deu errado... É a vidinha boa do interior.

- Nunca deu errado?

- Ah! Outro dia, a Vani chegou afobada e, sem notar, trocou a vasilha. Em vez da leiteira, colocou uma vasilha mais rasa, de boca larga e... sem tampa...

Daí a pouco, toca a campainha.

- D. Branca, olha aqui!

- Jesus! Santo Deus!

O gatinho da casa, que o Artur, meu netinho, batizou de Lucas (será por quê?), estava no bem-bom, tomando o leite da casa...

Nesse dia, tive que comprar leite de caixinha...

A Vani se desculpou:

- Era muito mais mió frevê o leite assim memo, pruquê, agora, com soda e água oxigenada que êzi põe, é muito mais pió...

 

 

 Em maio de 2002

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