LEITE DA ROÇA
Leite
em caixinha, leite ensacado nunca me pegou! Gosto de leite da roça, gosto do
barulhinho da charrete, gosto do cheiro de roça, do cavalo. Gosto de ver a
latona antiga, o litro de alça em que o leiteiro mede o leite e põe mais um
pouquinho “pra descontar a espuma”...
Às
vezes, os netos sobem na charrete e dão uma volta grande com o leiteiro, numa
alegria abençoada. E voltam contando o nome das vacas:
Mimosa,
Fumaça, Sombrinha...
Fico
terna, fico fada, lembrando-me das fazendas de minha infância... Com o nome delas, eu faria um poema.
“Melindro,
Boqueirão, Vitória, Porteira Pesada,
Campo Alegre, Barras, Olaria, Mata de Eufrásia, Monjolo, Pé da Serra,
Jabuticabas, Marmeleiro, Prendas, Rio Manso, Cor’go das Almas, Cor’go de Nossa
Senhora, Tapuias, Pasto Verde... Estrela. Paracambi..”
O gosto
de leite do curral curou meu coração, fincou raízes e nele fez morada.
* * *
Com o
tempo, “aprimorei” a entrega do leite: deixo uma vasilha na mesinha do
alpendre. O leiteiro – um amigo antigo – deixa o leite e, depois, a gente pega
lá.
Ali
mesmo, através de bilhetes, fazemos o acerto: ele deixa a conta, num
papelzinho, debaixo da vasilha. No outro dia, deixo o dinheiro. Se há troco,
ele deixa lá e nunca deu errado... É a vidinha boa do interior.
- Nunca
deu errado?
- Ah!
Outro dia, a Vani chegou afobada e, sem notar, trocou a vasilha. Em vez da
leiteira, colocou uma vasilha mais rasa, de boca larga e... sem tampa...
Daí a
pouco, toca a campainha.
- D.
Branca, olha aqui!
- Jesus!
Santo Deus!
O
gatinho da casa, que o Artur, meu netinho, batizou de Lucas (será por quê?),
estava no bem-bom, tomando o leite da casa...
Nesse
dia, tive que comprar leite de caixinha...
A Vani
se desculpou:
- Era
muito mais mió frevê o leite assim memo, pruquê, agora, com soda e água
oxigenada que êzi põe, é muito mais pió...
Em maio de 2002
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