CHUVA DE POESIA
Maria.
(Essa crônica é para
lembrar o Sô Tavinho, que ganhou -de presente -um Memorial com seu nome, lá em
Estrela do Indaiá: MEMORIAL OCTÁVIO SILVA)
-
Onde a poesia me encontrou?
-Onde
eu encontrei a poesia?
De
verdade, de verdade, não sei apontar um único lugar, um único momento pra
falar: FOI AQUI!
De
vez em quando, consulto meu coração e penso, penso...
Mas descobri: a poesia
é diferente de pessoas, é diferente de reis, rainhas, Papas,
Presidentes... Poesia não precisa de Certidão de Nascimento – ela já existe
sozinha. Penso que ela nasceu quando Deus fez o mundo e ficou por aí, em
qualquer cantinho, em qualquer nuvem, em qualquer sorriso. Assim, feito a
alegria, a felicidade, os sonhos.
Eu nunca
vi a poesia..Mas, que ela existe, existe.
_Onde encontrá-la?
_Não
sei ao certo...
Pensando
bem, encontrei a poesia em lugares nunca
dantes navegados, em lugares simples demais, em recantos escondidos demais,
em flores pequenas demais, em falas , em abraços, adeuses e chegadas...Encontrei
a poesia valsando lânguidas valsas, entoando cânticos em igrejinhas, rezando
ladainhas e até na boca do leiloeiro de prendas das barraquinhas de maio: Quanto me dão por este rebuçado?...
Pensando
bem, se eu quiser aprisionar a poesia para lhes mostrar o rosto que ela tem,
não conseguirei: ela é feiticeira, não se deixa aprisionar, assim, só numa
concha de mão...
Assim-
assim,... com encontro marcado, tenho certeza, não a encontrarei. A poesia é
misteriosa: se marco dia e hora para nos vermos, ela me escapa... Se eu não
espero, nem estou me lembrando dela, lá vem a
dama encantada e me carrega nos braços...
Pois
então: eu era bem mocinha, meninota, vivia em uma certa estrela – Estrela doo
Indaiá.
Uma
chuvinha fina, daquelas de molhar bobo, desmanchou
o vaivém que a moçada fazia em frente ao Bar Avenida, ao ladinho da igrejinha .
Naquele
tempo, andávamos pelo calendário da Folhinha Mariana e ela bem que avisou que
teríamos chuva... Mas, fingimos não acreditar...Não queríamos acreditar, porque
havia a promessa de novidades no ar... A decepção de ficarmos sem o vaivém foi
grande... O lugar era tão carente de surpresas boas!
Decepção
maior por causa da inauguração do
SERVIÇO DE ALTO-FALANTE IRMÃOS VASCONCELOS - coisa vista só em Parques e Circos – cometas
luminosos que apareciam de quando em quando...
Todo
mundo de roupa nova, papelotes nos cabelos, pintinha de lápis no rosto, uma
noite especial. Era só pedir uma música – num papelzinho rabiscado às pressas-
e a voz possante do Nonô e do Viê – irmãos estudantes em férias_ faria a mágica
dos ouvintes.
Tudo de graça- tudo dado – como dizia a Estrela toda: brinde da estreia que a
chuvinha fina atrapalhou...
Fomos
dormir, chuezinhas, eu penso que nossos olhos choravam como a chuvinha...O
silêncio na Estrela era total, só o barulhinho da chuva mansa no telhado
antigo...
De
repente, milagre!
Um
voz diferente, sem a energia dos dois locutores jovens e treinados para a doce
aventura de anunciar amores e carinhos
que alguém oferece a alguém e só este alguém sabe quem...
Maravilha! Alguém se apossara do microfone,
coisa chique demais para nosso lugarzinho encantado! Quem seria aquele estranho
que sabia lidar com tão importante aparelho?
Fui
prestando atenção naquela suavidade de voz, mais suave do que a chuvinha que
caía...
Descobri:
era o Sô Tavinho, aquele velhinho miúdo, aquele que era ator nos teatros,
aquele que sabia mil poemas de cor...Nas festinhas em sua casa – e eram muitas
– ele sempre recitava ( ainda existe esta palavra?) para nós...
Assentei-me
na cama, minha irmã fez o mesmo. Estávamos paralisadas pela beleza do momento –
ninguém ousava falar, nem com os olhos...
Por
sobre nosso telhado, havia um dueto: a voz macia da chuva, a voz macia do Sô
Tavinho:
DEUS ...plim..plim..plim...
Olavo plim...plim.. Bilac
Para experimentar Otávio....plim.plim..plim...
O mestre diz:plim...plim...plim...
“Já que tudo sabe, venha cá!
Plim..plim...plim...
plim...plim...plim...plim...
plim...plim...plim...plim...
Em que parte da extensão terrestre,
Ou da extensão celeste Deus está!”plim..plim...
Ou da extensão celeste Deus está!”plim..plim...
Por um momento apenas fica mudo
Octávio, plim...plim...plim
Octávio, plim...plim...plim
e logo esta resposta dá
:Plim..plim...plim...:
“Eu, senhor mestre, plim...plim... lhe daria tudo, plim...plim...
Se me dissesse plim...plim... onde é que ele não está!”plim..plim...
“Eu, senhor mestre, plim...plim... lhe daria tudo, plim...plim...
Se me dissesse plim...plim... onde é que ele não está!”plim..plim...
Plim...plim...plim...plim...plim...plim...plim...plim...plim-im-im-immmmmmmmmmmmmmmmmmmmm
Eu
não sei ao certo, mas desconfio de que, essa poesia jogada à chuvinha miúda,
por aquela voz cadenciada, quase chuviscando...
Eu
desconfio de que, naquela noite branca da Estrela, eu tive um belo encontro com
a poesia.
Acho
que até combinamos de sempre estarmos por perto uma da outra.
Tudo
por culpa de uma CHUVINHA FINA E A VOZ DE UM POETA SONHADOR....
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