LUGAR PEQUENO
Voltinha
de carro com a neta.
Uma
paradinha na esquina.
A amiga
pôs a cabeça dentro do carro e, sem mais aquela, num segundo, fez o relatório
do dia:
-
Menina, cê soube do fuá dos passarinhos?
- Dos
passarinhos? Não, o que houve?
A amiga
disparou, entusiasmada por me dar a notícia em primeira mão...
-
Nossa, então ocê não sabe ainda? A polícia de Belo Horizonte apareceu de
repente e levou a passarinhada todinha!!!
-
Todos?
- É. Os
primeiros foram os do Walmique.
A amiga
acentuou bem o nome do dono dos passarinhos, conhecido por ser sistemático e
não admitir brincadeiras... Muito menos com seus passarinhos!
Eu
respondi, compungida:
-
Coitado, ele vai adoecer, juro!
A vida
dele – e da Raquel – é só rezar e mexer com os mil passarinhos, com a gaiolada...
Ele vai adoecer, naquela nervosia, coitado! (O Bem concordou com um movimento
de cabeça)
- Mil,
vovó? Ele tem esse tanto de passarinho? Então, ele vai tomar injeção...
- Pois
é... Levaram as rolinhas-caldo-de-feijão do meu menino... Ele nem almoçou!
-
Tadinho!
-
Tadinho de quem, vó?
- Uai,
do filho dela!
- Ah,
pensei que era do homem dos mil passarinhos...
A
mulher se entusiasmou com as novidades:
-
Nossa, então cê não tá é sabendo de nada! Vou te contar tudinho! Meu filho
chegou da escola e falou: “Mãe, esconde o cravo que os homens tão pegando tudo!
Levaram até as Maritacas do Tito Sapateiro!”
-
Nossa! Aquelas que ficam na porta da sapataria, mexendo com a gente?
- É...
Ele não conforma...
Aí,
minha netinha quis saber o resto da história do cravo da mulher:
- E seu
cravo, pegaram ele?
- Não,
bem... Tranquei ele no quarto escuro e ele aprontou a maior berreira...
Minha
neta, a Marina, riu do cravo berrando no escuro e derramou pipoca no meu colo
todo.
O Bem
falou de lá:
-
Cuidado, Bubu – era o apelidinho dela – depois o carro fica cheio de
mosquito...
Ela nem
deu importância e o Bem até desligou o carro: o caso prometia ir longe...
- E os
soldados levaram ele? (Era a Bubu querendo saber o resto da história do cravo)
- Nada,
nem apareceram! (E ria aliviada...)
- Pior
foi com a comadre Tina... Ela pôs os periquitos lá na coberta e...
-
Levaram eles?
- Não,
o gato comeu todos!
- E as
maritacas do Tito Sapateiro? Nó! Todo mundo vai sentir falta delas...
- Pois
é, aquelas maritacas eram chiques, sabiam falar de tudo, eram ensinadas, vai
ser o maior pesar...
- Vó,
foi aquela que mandou a gente tomar banho?
- Fala
baixo, Marina! (Era o vô, sempre cauteloso e elegante...)
- Foi
aquela mesmo...
- Bem
feito!
Nós
rimos muito e cada um se lembrou de uma passagem das maritacas, falando
desaforos e fazendo graça para quem passava...
Elas
não respeitavam ninguém e a cidade toda tinha o maior carinho por elas...
-
Nossa, menina! Diz que hoje, lá na Sapataria do Tito, tá a maior tristeza: puseram uma faixa preta, grando-o-o-na-a-a-a
no poleiro das maritacas...
-
Credo!
- Pra
quê, vovó?
- Em
sinal de luto, suspirou a amiga! (O Bem olhou enviesado no espelhinho, sondando
minha reação...)
Enquanto
isso, a neta aprontou mais confusão com as pipocas e nós fomos embora, para alívio
do Bem.
Daí a
uma semana, meu filho- estudante em Belo Horizonte- chegou contando:
-
Mamãe, o Tito conseguiu as maritacas de volta!
- Como?
- Uai,
ele provou que elas vivem em liberdade e levou dois vereadores daqui, lá na
Deputada, em Belo
Horizonte.. .
E arrematou rindo:
- O
povo falou que elas não davam sossego lá e gritavam o tempo todo:
- Tito,
vem me buscar!
- Tito,
socorro!
- Tito,
help! As diabinhas até falam em inglês.
Meu
filho –muito brincalhão-saboreava nossa surpresa e eu, até hoje, desconfio de
que as maritacas falavam em inglês...
Agora,
elas estão lá na maior crença.
Mexem
com todo mundo, na maior falta de cerimônia e a cidade toda aplaude!
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